Cade abre processo para investigar 21 empresas por cartel na Petrobras - Página Xique-Xique

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23 dezembro, 2015

Cade abre processo para investigar 21 empresas por cartel na Petrobras

Além das companhias, conselho irá apurar envolvimento de 59 pessoas. Segundo órgão, grupo de construtoras atuou em contratos de R$ 35 bilhões.






O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, abriu nesta terça-feira (22) um processo administrativo para apurar se 21 empresas e 59 pessoas – executivos e funcionários das companhias –, se uniram para a prática de cartel na Petrobras. Segundo o Cade, a soma dos contratos nos quais há evidência da atuação do chamado "clube das empreiteiras" é de R$ 35 bilhões.

A legislação brasileira sobre cartéis define a prática como os casos nos quais empresas concorrentes ajustam preços, oferta, divisão de mercados e de outras variáveis relevantes numa disputa de mercado.

No caso de licitações públicas, as empresas que prestam o serviço ou oferecem o produto podem aumentar preços, reduzir as ofertas e diminuir incentivos à inovação, por exemplo, causando prejuízos aos órgãos públicos contratantes.

Entenda os diferentes tipos de delações premiadas

No documento que confirma a instauração do processo, com 221 páginas, técnicos do Cade apontam "existência de indícios robustos de infração à ordem econômica" e afirmam que há elementos que apontam o cartel em pelo menos sete licitações da Petrobras, além de outras "potencialmente afetadas". Entre essas obras estão a Refinaria do Nordeste (Rnest, também conhecida como Abreu e Lima) e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

Serão alvos do processo a Setal Óleo e Gás, que firmou acordo de leniência no Cade em março e deu início às investigações no órgão; a Camargo Corrêa, que assinou um Termo de Compromisso de Cessação (TCC), tipo de acordo para colaborar e que reduz as punições; e mais 19 empresas: Alusa Engenharia, Carioca Christiani Nielsen Engenharia, Andrade Gutierrez, Norberto Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Engevix, Galvão Engenharia, GDK, Iesa, Jaraguá Equipamentos, Mendes Júnior, MPE Montagens e Projetos, Promom Engenharia, Schahin, Skanska, Techint, Tomé Engenharia e UTC.

Entre as pessoas que serão alvos do processo no Cade estão delatores da Lava Jato, como Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC, e Eduardo Leite, ex-vice-presidente da Camargo Corrêa.

Em seu acordo com o Cade, a Camargo Corrêa admitiu participação no cartel para licitações da Petrobras. A empresa concordou em pagar mais de R$ 104 milhões.

No Cade, só uma empresa pode fazer acordo de leniência: a primeira que procura o órgão para revelar o esquema de corrupção em troca de benefícios. No caso da Petrobras, a Setal é a companhia que ficará livre de punição, ganhando imunidade, se, ao final do julgamento, o conselho entender que, de fato, houve colaboração para elucidar as irregularidades.

A Camargo Corrêa, que fez um acordo para parar com a prática de cartel, pagou R$ 140 milhões de multa ao órgão. No decorrer do processo no Cade, outras empresas podem firmar acordo como fez a Camargo para reduzir as eventuais punições.

Executivos de algumas das empreiteiras que são alvo de investigação no Cade já fizeram acordo de delação premiada na Justiça para assumir crimes praticados e devolver parte dos recursos desviados. Entre esses delatores estão funcionários e ex-funcionários da UTC e da Camargo Correa.

Por outro lado, executivos da Odebrecht e da Queiroz Galvão negam a existência de cartel e dizem não ter envolvimento em fraudes na Petrobras.

Para autorizar a abertura das investigações, o Cade se baseou em provas coletadas na Operação Lava Jato em processos em curso na Justiça Federal do Paraná, além de documentos apresentados pela Setal e pela Camargo, que fizeram acordos para contar detalhes do esquema e reduzir as punições.

"Verifica-se a existência de indícios robustos de práticas prejudiciais à livre concorrência, supostamente, adotados pelos representados no mercado de licitações, conduzidas pela Petrobras, para contratação de serviços de engenharia, construção e montagem industrial. Há fortes indícios de que teriam celebrado ajustes com a finalidade de fixar preços, dividir mercado e ajustar condições, vantagens ou abstenção em licitações públicas conduzidas pela Petrobras", diz o órgão.

O que disseram as empresas

A Camargo Corrêa afirmou, por meio de sua assessoria, que o acordo firmado pela empreiteira com o Cade faz parte de seu programa de controle interno, "que busca corrigir desvios e assegurar um ambiente de negócios éticos, justos e sustentáveis.”

Por meio de sua assessoria, a Andrade Gutierrez, Galvão Engenharia, Engevix, Carioca Engenharia e a Techint afirmaram que não irão comentar a abertura do processo no Cade.
O advogado Mário de Oliveira Filho, responsável pela defesa da Iesa, disse que ainda não teve acesso aos autos do processo e, por isso, não comentará o assunto.

A Odebrecht, a Queiroz Galvão e a Schahin informaram que não foram notificadas oficialmente sobre esse processo no conselho e não vão se manifestar.

As assessorias da UTC e da Mendes Júnior declararam que as empresas não comentam investigações em andamento.

A Skanska ressaltou, por meio de sua assessoria, que a empresa "conduz seus negócios com alto grau de integridade e ética e continua à disposição para colaborar com as autoridades".

A assessoria de imprensa da Promon informou que a empresa está em férias coletivas e que não foi possível localizar nenhum representante da construtora para se posicionar sobre a investigação do Cade.

O G1 entrou em contato com OAS, Setal Óleo e Gás, Mendes Júnior, Tomé e Alumini Engenharia, mas até a última atualização desta reportagem ainda não havia obtido resposta.

A reportagem não conseguiu localizar a Jaraguá Equipamentos, o Grupo MPE e a GDK.
Cartel
O crime de cartel é considerado a conduta mais anticompetitiva na área empresarial e, no âmbito do Cade, é punido com multa – que pode chegar a até 20% do faturamento bruto anual da empresa – além da proibição de firmar novos contratos com a administração pública e de obter empréstimos em bancos públicos.

A prática também é crime punido com até cinco anos de prisão, mas até agora o Ministério Público Federal apenas investiga se houve a fraude no âmbito da Lava Jato, ou seja, não apresentou denúncia criminal pelo crime de cartel.

A medida provisória editada na semana passada pela presidente Dilma Rousseff para modificar a legislação que trata dos acordos de leniência – aliviando a punição a empresas envolvidas em fraudes, sem proibir novas contratações – em tese não afeta o processo no Cade, porque a MP muda a lei anticorrupção, e não a lei que pune ações anticoncorrenciais. No entanto, quando o processo for julgado no conselho, isso poderá ser analisado pelo Cade.

Com a instauração do processo administrativo no conselho, as empresas serão notificadas para apresentar defesa em até 30 dias e será iniciada a chamada instrução do processo, com coleta de provas e depoimentos de testemunhas. Só depois dessa fase, que não tem prazo para ser concluída, é que o Cade vai julgar se condena ou não pessoas físicas e jurídicas.

Histórico

O inquérito do Cade para apurar se houve cartel foi instaurado em outubro do ano passado, em meio às negociações do órgão com a Setal Óleo e Gás para se firmar acordo de leniência.

Segundo os dados do conselho, o grupo começou a atuar em 1998, mas consolidou a atuação a partir de 2001. O auge se deu em 2006, com a formação do chamado "clube vip" das empreiteiras para fraudar licitações, com a participação de empresas como Andrade Gutierrez, OAS, UTC, Odebrecht e Camargo Corrêa, as maiores empreiteiras do país.

No documento de abertura do processo, o Cade diz que verificou indícios de cartel em sete licitações: Refinaria Henrique Lage (Revap) – HDT Diesel; Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar) – Off sites HDS Gasolina; Refinaria Henrique Lage (Revap) – HDS Nafta URC; Refinaria de Paulínia (Replan); Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar) – UCR; Refinaria do Nordeste (Rnest – Refinaria Abreu e Lima); e Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

Evidências

O órgão apresenta diversas evidências da prática, entre as quais e-mails e planilhas apreendidos com executivos das empreiteiras. Uma delas, em poder da Engevix, cita critérios utilizados pela empresas para calcular a taxa de sucesso das propostas comerciais que apresentaria em licitações públicas.

"A empresa estimava que, nos casos em que participasse de licitações por convite com pré-acordo, a possibilidade de vencer o certame alcançaria 70%. Ora, a Petrobras era a única que podia, dada a especificidade das normas que regem seu processo de contratação, realizar licitações de grande porte na modalidade convite. E o termo pré-acordo, é razoável afirmar, parece indicar que se refere às definições levadas a cabo no âmbito do cartel", diz o Cade.

Ainda conforme o documento, nos e-mails e planilhas, empresas chamam o cartel de "mercado" e se fazem alusões do esquema a um campeonato, citando "times" e "próximos jogos".

"Interessante notar a mensagem eletrônica apreendida na Galvão (...) intitulada 'Jogo', na qual há referência a 'reunião com todos os times para discussão dos próximos jogos', a indicar que – nos termos das 'Regras do Campeonato Esportivo' – faziam referência às empresas integrantes do cartel ('times') e a reunião na qual seria discutida a divisão das próximas licitações ('próximos jogos')."

Desvios da Petrobras

Além dos R$ 35 bilhões que o Cade estima que tenham sido alvo de cartel das fornecedoras da Petrobras, há também cálculos de desvios de dinheiro da estatal que teriam ocorrido por meio do pagamento de propinas e superfaturamento de contratos.

A Polícia Federal estima que as irregularidades na petroleira descobertas pela Lava Jato pode chegar a R$ 42,8 bilhões, de acordo com o laudo de perícia criminal anexado pela corporação em um dos processos da operação.

Já a própria Petrobras calcula que o prejuízo em seus cofres com desvios provocados pela corrupção atingiu R$ 6,2 bilhões. O valor foi anunciado em dois diferentes balanços da petroleira ao longo de 2015.


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